Vivemos em uma sociedade igualitária após dezenas de revoluções e protestos que deram voz à classe feminina. Bom, isso é o que se escuta desde que você se entende por gente, porém, não é o que pode ser presenciado sempre. É certo que um histórico de mudanças ocorreu na vida da mulherada desde a Revolução Industrial, mas talvez seja necessária mais uma vida para que se chegue à igualdade de forma correta entre os sexos.
Para tentar me fazer entender, devo salientar a necessidade de grifar o quão inferiorizada foi (e ainda é) a classe feminina em relação à macharada durante todo o processo histórico – desde a chance de trabalhar fora de casa até o direito de voto. Através dessas conquistas, o sexo “frágil” iniciou seu processo evolutivo, até chegar aos dias atuais, onde domina o campo de trabalho (somos a maioria no corporativismo) e escolhe se quer o combo casa-filho e todo o pacote estressante (e indubitavelmente glorificante) em seus dias. E entre gravatas e saias lápis em salas de reuniões, pode-se ter exemplos de como ainda somos inferiorizadas. Principalmente se for uma saia lápis entre diversas gravatas (Google para você que não conhece o modelo de saia lápis).
Ainda é fácil ouvir um “ah, ela dá para o chefe” ou “saiu com a equipe toda” sobre uma mulher que se destaca entre os demais da empresa. Para chegar a um patamar de sucesso, a classe dominante de ovários precisa ralar dobrado. Além de não receber, na maioria das vezes, a mesma remuneração financeira que a classe masculina (tendo o mesmo estresse diário). Há os que irão me chamar de hipócrita ou sem senso, mas especialmente a estes, peço que pensem na mulher mais bem sucedida do seu trabalho e procure na memória algum comentário sobre ela. Viu só? Isso ocorre porque o mundo ainda não está preparado para a mudança completa no cenário feminino. Não culpo a macharada, pelo contrário; a muherada também mete a coça nas concorrentes. Isso infelizmente ainda faz parte da cultura machista da sociedade patriarcal da qual fazemos parte.
No quesito maternidade, optar por não ter filhos é quase como um pecado. É certo que nós possuímos o dom de gerar vidas, mas quando gerado somente para preencher o formulário da procriação, torna-se uma bomba. Ser mãe demanda tempo, estudo, paciência e muito amor. Caso contrário, lhe trará apenas frustração e um sentimento de incapacidade. Durante os últimos anos, o aumento das estatísticas quanto à escolha da mulherada em não querer procriar chegou aos 16%, justamente pelo seu crescimento no campo profissional. Encaixar os pimpolhos na rotina tornou-se algo quase heroico, afinal, não é fácil gerenciar casa, manter foco no trabalho, pesquisar sobre comportamento infantil e – caso exista um companheiro – ser amante insaciável. É preciso fazer escolhas.
E na vida amorosa? Presenciamos protestos, marchas das vadias, discursos políticos de igualdade entre todos e, atualmente, temos a primeira “presidenta” do país, mas nas cidades, no dia a dia, a melodia é diferente. Tenho muitos amigos do sexo masculino e, sortuda que sou, ouço muita aventura amorosa em mesa de bar – e janela de Whatsapp também. Porém, até hoje nenhum deles conseguiu me responder o que determina uma mulher “de uma noite” e uma mulher “para casar”, como eles costumam selecionar. Insisto na pergunta porque me custa a entender porque eles deitam-se com inúmeras, azaram, viajam, bebem, se divertem e, esses mesmo, viram para mim e falam “está faltando mulher decente no mercado”. Opa, e as que te proporcionaram prazer e diversão? Porque por mais centrada que ela seja, se beber demais, é criticada; se dormir com alguns, é rotulada; se for curiosa no âmbito sexual, é danada. Ser dona do próprio nariz e agir como tal ainda assusta. E como assusta.
Por mais que já tenhamos conquistas, a estrada é longa, porém finita. É preciso mais um tempo, mais uma década, quem sabe, para que o mundo entenda que o sexo frágil na verdade não tem nada de frágil. Esse tempo também servirá para mostrar às batalhadoras que ser independente não significa ser bruta. Que a mulher nasceu da doçura, da fantástica fusão da delicadeza e determinação, e não precisa endurecer. É preciso mais um tempo, porém, não mais uma vida.
- Texto elaborado para a revista eletrônica Afronte – https://www.afronte.com.br/a-dor-e-a-delicia-em-ser-chamada-de-sexo-fragil/
Flávia Motta é jornalista, tradutora e professora de idiomas. Nas horas vagas se arrisca a escrever nos idiomas os quais andou aprendendo nessa vida. É alagoana de nascimento e criação, e com orgulho, mas se considera passageira do mundo.