Os programas de gastronomia, a onda da “gourmetização”, o movimento de receber em casa e o crescente interesse pela mesa posta tem levado as pessoas a se aventurarem nas cozinhas – espaço antes negligenciado – e, como consequência, a resgatarem o interesse pela culinária e pela etiqueta à mesa.
O que é essa tal de etiqueta à mesa?
A etiqueta à mesa, de uma forma genérica, ocupa-se do aparato necessário à refeição, incluindo o posicionamento e os critérios de uso, além de outras normas relacionadas à manipulação do alimento e ao comportamento à mesa. Ou seja, cuida de todo cerimonial envolto em uma refeição, desde seus utensílios e sua correta disposição sobre a mesa até a postura perante o alimento e os demais convivas.
Ela se manifesta durante todo o eixo temporal da refeição: antes (preparação da mesa); durante (interação à mesa) e pós (desarranjo da mesa). Em todas essas etapas, há prescrições necessárias a serem seguidas.
Destacamos, porém, um ponto: não estamos à mesa apenas para apreciar os itens da mesa e o alimento, mas também para aproveitar a companhia dos demais, como destaca o historiador Henrique Carneiro “o que se come é tão importante quanto quando se come, onde se come, como se come e com quem se come”.
Mas, qual a verdadeira etiqueta à mesa?
A partir de uma visão pautada nas relações humanas, a reflexão que aqui se propõe é sobre onde se aplica a verdadeira etiqueta à mesa: na disposição de recursos tangíveis sobre a mesa ou na construção de relações intangíveis perante a mesa?
Digo isso, porque, às vezes, nos preocupamos tanto com a etiqueta à mesa, em seu sentido material, que ficamos presos a preceitos e regras que podem ser atenuadas e/ou adaptadas conforme cada contexto – é lógico que com parcimônia, a fim de não “derrubar convenções socialmente aceitas”, conforme pondera Judith Martin.
A etiqueta à mesa do ponto de vista de todo o aparato utilizado é essencial e necessária, pois faz parte da cultura material dos povos e respeitar esse regramento com relação a função e a posição de cada item é primordial para o adequado ritual da refeição.
Entretanto, ela também deve ser analisada sob a ótica das relações humanas, a qual se concretiza nas conversas e no diálogo sadios entabulados à mesa, buscando uma demonstração de consideração e respeito ao outro.
A importância do diálogo
Afinal, o ato de comer possui uma carga relacional muita ampla, pois perpassa a importância nutricional e biológica e se solidifica em uma necessidade social. Por esta visão, preocupar-se apenas com minúcias relacionadas ao posicionamento milimétrico de itens se torna secundário diante deste propósito maior, pois de nada adianta um rigor na etiqueta exposta e uma displicência nas relações estabelecidas à mesa.
O ato de conversar durante as refeições é cultural, sobretudo para nós brasileiros. É prática aceita e muito bem vista, aliás bons comunicadores são figuras sempre bem vindas em reuniões sociais.
Assuntos como “religião, política, doenças, mortes, acidentes, escândalos, devem ser evitados”, a fim de não constranger nem aborrecer os demais. Outro detalhe importante na conversa à mesa é que, por mais interessante que seja assunto, se ele for estendido em demasia torna-se cansativo, portanto toda conversa deve ser iniciada, desenvolvida e encerrada em momento oportuno.
Bom senso e equilíbrio são medidas necessárias em todo espaço social, sobretudo no limitado espaço da mesa. Aqui, não cabem ofensa, agressão, polêmica, ostentação. Selecione assuntos agradáveis, inclua todos os convivas na conversa, pois assim terá a certeza de não ocorrer situações embaraçosas. Afinal, independente do rigor da sua mesa – formal ou não -, a etiqueta para a conversa à mesa não muda.
Aliás, quando o assunto é desagradável, cabe seguir o conselho da pianista norte-americana, Nina Simone, “você tem que aprender a se levantar da mesa quando o amor não está mais sendo servido.”
Uma eterna estudante, apaixonada pelas linhas: as escritas e as bordadas. Compartilha sua paixão pela etiqueta como uma forma de espalhar pequenas gentilezas e delicadezas pelo seu caminho.
Tem como propósito disseminar a etiqueta como uma ferramenta inclusiva capaz de potencializar as conexões humanas.