Entre a memória e a liberdade: sobre sentir e dar sentido

Antes de qualquer coisa, devo confessar que pensei bastante sobre o que compartilhar aqui. Deve ser porque essa é a minha primeira vez no portal [inclusive, prazer!]. Ou pelo frio na barriga que me acompanha sempre que estou de frente para o novo. Vai saber.

O fato é que cheguei à conclusão de que essa jornada deveria ser iniciada com um relato pessoal, engraçado ou constrangedor, por que assim ficaríamos íntimos de uma só vez. Boa, né? Tendo definido a meta, me aventurei em um processo de ‘inspeção’ da memória, em busca de algo que nos aproximasse.

Porém, me flagrei demorando mais do que gostaria em alguns dos meus momentos mais doloridos e menos esclarecedores. Epa.

Até tentei me convencer de que esse não era o objetivo, mas olha… foi em vão. Tava tudo lá. Tá tudo aqui. Até agora. 

Perdida nesse limbo, supus que poderia ser diferente: e se algumas dessas recordações pudessem ser apagadas?

Foto: Natie Melo

Eu sempre considerei liberdade e memória dois conceitos complicados. Afinal, o que é ser livre em meio ao caos que é lembrar e não conseguir se distanciar de si?

Em contrapartida, seria liberdade se não fosse dessa forma? Se não pudéssemos nos colocar como testemunhas de nós e aprender algo novo com o que agora é velho, mas que ainda assim não conseguimos soltar?

Sempre tive dúvidas sobre essas coisas.

Contudo, sei que fui livre no dia em que decidi abandonar um barco furado por que sabia que ia me afogar. Ou quando tomei banho de mar nua. Ou na primeira vez em que viajei sozinha. Ou quando me demiti, mesmo sem grana.

Só que, dentro disto, há algo que não posso negar: essas escolhas só se materializaram depois de momentos de introspecção e autoavaliação. No dia da nudez, por exemplo, revisitei momentos em que não quis ver meu corpo… e que não quis que o vissem.

E a partir daí me pego pensando que a liberdade deve estar inserida, fundamentalmente, no ato de lembrar. Por que a memória guarda uma identidade nossa que não é lógica: é viva, como um organismo.

Afinal, é só quando recordamos que fazemos esse ‘inclinamento’ em direção ao que a gente foi em outro momento… em direção a nossa própria vulnerabilidade.

E isso é ou não é tudo que habitamos?

Acho que a complexidade da memória faz jus à complexidade da alma.  E que poder voltar para ela é estar presente, no agora. Vivo. E falo de uma vida que só pode existir naquilo que a gente sente, na consciência que temos de nós.

Naquilo que nos dá sentido.

Já perdi as contas de quantas vezes ouvi que só um pássaro conhece a liberdade. O que não nos contam é que ele voa por condicionamento genético, não por escolha.

E onde mais, além do momento em que optamos, somos livres?

Eu sei que a simplicidade dessa última constatação pode ser decepcionante. Mas, também podem ser um convite.

Vamos voar?

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