Cancelaram você ou sua marca nas redes? Calma, calma, é motivo para atenção, mas não para desespero. Não é agora que o mundo termina. Ainda temos muito chão para percorrer.
No primeiro trimestre deste ano, o assunto da vez foi o cancelamento, motivado pela estreia da 21ª edição do Big Brother Brasil. A artista e rapper Karol Conká, protagonizou a maior rejeição da versão nacional do reality, atingindo 99,17% de votos pela sua eliminação. Durante o programa, Karol contabilizou a perda de meio milhão de seguidores e, segundo a Bruch, agência especializada em influência digital, somou o prejuízo de até 5 milhões de reais. Não é brincadeira um baque desses. Como se não bastasse, o canal por assinatura GNT adiou sem previsão de data, o programa Prazer Feminino, que estrearia com Karol como apresentadora.
Quem não teme o cancelamento? Todos nós. Mas quem não hesita em cancelar alguém? Todos nós. Será que o mal virou contra um grupo gigantesco de feiticeiros? Bem por aí.
Antes de tentarmos te acalmar, listando algumas soluções para o cancelamento que você sofreu ou teme sofrer, vamos compreender rapidamente o que é o cancelamento.
Cancelar uma marca ou alguém é o mesmo que boicotar ou deixar de seguir esta empresa ou influencer. Mais do que dar unfollow nas redes, rompe-se os laços com a marca ou pessoa cancelada, parando de consumir seus produtos, serviços, conteúdo e quaisquer outros itens do cancelado.
Até aí, tudo bem, porque isto é o mesmo que boicotar. E boicote é um direito mundial de todas as pessoas consumidoras. O primeiro cancelamento aconteceu e 1880, contra o irlandês Charles Boycott, que tentou expulsar trabalhadores agrícolas de suas terras, além de oprimí-los, obrigando-os a consumir somente do que era plantado nas suas fazendas. Os trabalhadores então se manifestaram tentando evitar Chales Boycott em tudo: trabalhar em suas terras, comprar seus produtos, etc. Num instante, o nome Boycott estampou a imprensa, virou notícia e até hoje, é um verbo praticado em todo o mundo. Ao longo da história, várias marcas foram boicotadas por diferentes motivos. O poder então foi se fortalecendo nas mãos dos consumidores.
Em 1999, John de Mol, executivo da empresa Endemol, criou um programa do tipo reallity show, chamado Big Brother, bem conhecido por nós. Pela primeira vez no mundo, a audiência foi incentivada a eliminar, e por que não dizer cancelar, cada um dos participantes de um programa. Aqui no Brasil, o programa estreou em 2002 e desde então, a cada edição, nos divertimos cancelando alguém no paredão. Isto mesmo, o BBB é padrinho do cancelamento. A pessoa vencedora do programa não é a que tem mais mérito, nem a mais querida, nem a mais talentosa ou a mais habilidosa. Vence quem não foi cancelado. É um programa de eliminação. A cada semana, não temos um vencedor, mas sim, um eliminado. Talvez você esteja em choque, porque até então não tinha associado o BBB ao cancelamento. Mas esta é a real. Se você já torceu ou vibrou pela eliminação de algum participante do BBB, você já celebrou pelo cancelamento de outras pessoas.
A hashtag #cancel apareceu pela primeira vez em 2017 no movimento Me Too, que denunciou uma série de assedio moral e abuso sexual contra mulheres. Foi aí que a cultura do cancelamento tomou corpo e força, em nome de uma boa causa, expondo e derrubando muitos homens poderosos, que foram denunciados e consequentemente, cancelados.
O problema é que atualmente, a cultura do cancelamento não fica só no boicote ou na denúncia de um crime, infração ou erro. As pessoas canceladoras praticam o linchamento virtual, minando os meios de ganhos financeiros do alvo cancelado e, mais do que isto, cometem agressão moral ou até ameaças de morte contra as pessoas expostas.
Quando o cancelamento se limita ao boicote ou à exposição de um erro, ele é legítimo e funciona como um alerta sobre algo que precisa ser corrigido. Mas quando tem o objetivo de humilhar, maldizer, esquartejar alguém moralmente, a cultura do cancelamento se torna uma arma letal de expressão de ódio.
Agora que você já tem um panorama sobre a cultura do cancelamento, vamos para os caminhos no caso de você ou a sua marca já ter sofrido cancelamento:
– analise com cuidado e frieza as razões alegadas para o cancelamento. O quanto elas são verdadeiras? Onde você ou a marca errou? Os motivos alegados pelos canceladores são justou ou são reações conservadoras de uma sociedade que resiste em se modernizar? Se for este último caso, não vacile, nem se deixe amedrontar, abrace a cidadania e siga com firmeza.
– reconheça a falha publicamente. É importante fazer um pedido oficial de desculpas, explicando os motivos do erro. Mas não pode parar aí, nada de passar pano para o que não está certo. É preciso explicitar cada um dos aprendizados e o que você ou a marca fará de diferente a partir daí. Só pedir desculpas não vale. É fundamental assumir um compromisso com a mudança concreta, divulgar um cronograma das alterações que serão feitas e monitorá-las para que funcionem da melhor forma.
A cultura do cancelamento não encerrou na Karol Conká. Muitos micro influencers não tão conhecidos ou marcas locais também são alvo do cancelamento, que atinge muito mais a reputação da pessoa ou da marca cancelada. É tempo de mudanças, então antes de sofrer um cancelamento, verifique o que precisa ser mudado na sua empresa, marca ou mesmo nas suas atitudes ou valores. A cultura do cancelamento está à espreita para caçar abordagens racistas, homofóbicas, machistas ou retrógradas, mas o cancelamento também tem sido usado por grupos conservadores contra ações inclusivas. O segredo do sucesso você já sabe: abrace a cidadania, seja à favor da inclusão e tudo estará à seu favor.